Eutanásia
A eutanásia, prática de encerrar a vida de um paciente para aliviar sofrimento insuportável, foi legalizada na Holanda e Bélgica em 2002, com um aumento significativo de casos desde então devido à maior aceitação social, menor influência religiosa e visões políticas progressistas, além de mais profissionais de saúde dispostos a considerar a eutanásia para condições psiquiátricas graves; no Brasil, a Constituição de 1988 garante o direito inviolável à vida, classificando a eutanásia como homicídio ou auxílio ao suicídio, com um único projeto de lei propondo permissão em casos de morte cerebral, embora incompleto, e sem apoio judicial ou legislativo significativo para sua legalização.
Eutanásia no Mundo[edit]
O tema da eutanásia, que envolve questões legais, morais e éticas, tem sido amplamente discutido na literatura científica e nos debates públicos. “A eutanásia é a prática deliberada de matar um paciente para aliviar seu sofrimento insuportável, normalmente a pedido do próprio paciente” palavras do artigo "Euthanasia and physician-assisted suicide: A review of the literature" publicado no Journal of Pain and Symptom Management. Quando há consentimento explícito, esta prática pode ser voluntária, ou pode ser involuntária, quando o paciente não pode dar seu consentimento. A eutanásia está intimamente ligada à autonomia do paciente, à dignidade do paciente no fim da vida e ao papel dos profissionais de saúde na prestação de cuidados terminais. Além disso, há uma variedade de leis em todo o mundo que abordam a eutanásia de diferentes maneiras, refletindo uma variedade de crenças culturais e éticas sobre a vida e a morte
A Holanda sendo pioneira nesse cenário, com a legalização em 2002, seguido da Bélgica também em 2002, sendo esse os dois únicos países no mundo que a prática da eutanásia é regulamentada.
O número total de casos tem aumentado de forma consistente desde que a eutanásia foi legalizada na Holanda em 2002. Em 2002, 1.882 casos foram registrados. Este número aumentou para 4.188 em 2012 e 9.068 em 2023 foram reportados.(CURRENT REVIEWS, 2024) Vemos assim que a prática da eutanasia aumentou significativamente durante os anos e pode ser atribuído a vários fatores como a evolução das atitudes sociais e a maior aceitação da eutanásia como uma opção de fim de vida têm desempenhado um papel significativo. Isso é particularmente evidente em regiões onde há menor frequência de práticas religiosas e onde predominam visões políticas progressistas. Nessas áreas, as pessoas tendem a ver a eutanásia como uma escolha válida para aliviar o sofrimento insuportável sem perspectiva de melhora.(GROENEWOUD, 2021).
Além disso, houve um aumento no número de profissionais de saúde, especialmente psiquiatras, que estão dispostos a considerar a eutanásia para pacientes que sofrem de condições psiquiátricas graves. Este aumento é acompanhado por uma maior compreensão e aceitação de que o sofrimento mental pode ser tão debilitante quanto o sofrimento físico, levando a um aumento nos casos de eutanásia por motivos psiquiátricos.(TUFFREY-WIJNE, 2023).
Alguns estudos indicam que fatores socioeconômicos, como a renda alta e a boa saúde autoavaliada, estão correlacionados com taxas mais altas de pedidos de eutanásia. Pessoas com melhor situação financeira e saúde geral são mais propensas a optar por eutanásia quando enfrentam doenças graves ou declínio na qualidade de vida, buscando evitar o sofrimento prolongado.(WORLD FEDERATION OF RIGHT TO DIE SOCIETIES, 2024).
Eutanásia no Direito brasileiro[edit]
No contexto brasileiro, o artigo 5° da Constituição Federal de 1988, estabelece de forma direta o direito à vida, sendo este um direito fundamental, o qual os cidadãos brasileiros não podem de forma arbitrária abdicar, ou seja, é um direito inviolável, ninguém pode tirar a vida de outra pessoas nem mesmo a sua própria vida independentemente da situação. Quando olhamos para as matérias infraconstitucionais, o Código Penal vigente não cita de forma clara a prática da eutanásia, entretanto a interpretação dos artigos 121 e 122 de tal código, classifica a eutanásia como sendo homicídio, e perante o artigo 122, pode ser entendido como auxílio, instigação ou induzimento a prática do suicídio. (SANTOS; JESUS NETO, 2021).
Apesar disso, certos juristas defendem a eutanásia como uma manifestação do livre desenvolvimento da personalidade e da autonomia da vontade, embasada na dignidade intrínseca da pessoa humana. Algumas fontes a encaram como um exercício do direito à vida, enquanto outras a percebem como uma derivação desse direito. Independentemente do arcabouço jurídico adotado, a dignidade humana permanece como o alicerce primordial. Outros princípios constitucionais, como a proibição de tortura e tratamento desumano, a liberdade individual e a preservação da integridade física e psicológica, podem servir de base para esse direito. A dignidade é vista tanto como autonomia (capacidade de autodeterminação) quanto como heteronomia (valores compartilhados pela comunidade). Prevalece a compreensão da dignidade como autonomia, o que pode legitimar constitucionalmente a eutanásia ativa voluntária. No entanto, apesar das fundamentações jurídicas e constitucionais, ainda não há apoio judicial ou legislativo significativo para sua legalização. (JUNQUEIRA; FREITAS, 2020).
No Brasil, o Projeto de Lei nº 125/96, proposto pelo Senador Gilvam Borges, foi o único projeto de lei sobre o assunto da legalização da Eutanásia no Brasil. O projeto prevê a permissão da eutanásia em casos de morte cerebral, desde que haja manifestação de vontade do paciente ou autorização expressa da família. Também aborda a eutanásia por omissão e diferencia entre eutanásia ativa e passiva. O Anteprojeto do Código Penal, por sua vez, define a ortotanásia, não a eutanásia. O anteprojeto considera a eutanásia um crime comissivo, punido de maneira menos severa. No entanto, o projeto é considerado incompleto por não abordar aspectos importantes, como regulamentação de prazos e procedimentos médicos. Além disso, em 1984, houve um anteprojeto de reformulação do Código Penal que também poderia ter permitido a eutanásia passiva, sob certas condições. (ROSA, 2017).
Diferentemente da eutanásia a ortotanásia, não antecipa a morte, mas sim aceitar a mortalidade no momento adequado, proporcionando cuidados para evitar o sofrimento do paciente. Na ortotanásia são utilizadas condutas médicas restritivas para não prolongar o sofrimento físico. A prática da ortotanásia, que visa evitar o prolongamento desnecessário do sofrimento físico, é menos contestada pelos setores conservadores da sociedade e é reconhecida pela comunidade médica. No Brasil, apesar da falta de legislação específica, o Conselho Federal de Medicina (CFM) emitiu uma resolução em 2006 permitindo que médicos suspendam procedimentos que prolonguem a vida do paciente em fase terminal. Essa resolução foi contestada pelo Ministério Público Federal, mas posteriormente confirmada judicialmente. Em 2010, o próprio Ministério Público Federal mudou seu entendimento e reconheceu que a ortotanásia não constitui crime de homicídio. (ANDRADE, 2024).
Assim, embora exista uma base argumentativa e jurídica que possa sustentar a legalização da eutanásia, a falta de consenso político e social, aliada a um forte arraigamento dos princípios tradicionais do direito à vida, faz com que a eutanásia permaneça ilegal no Brasil, sendo legalizada apenas a prática da ortotanásia.
Referências[edit]
GROENEWOUD, J. H.; VAN DER HEIDE, A.; VAN DER MAAS, P. J.; VAN DER WAL, G. A. Variação regional na prática da eutanásia e do suicídio assistido por médico na Holanda. BMJ, 2021.
TUFFREY-WIJNE, I.; CURFS, L.; VAN DE WIEL, H.; KERR, M. Dificuldades de aprendizagem e autismo: factores que influenciam os pedidos de eutanásia e suicídio assistido na Holanda. BJPsych Open, 2023.
WORLD FEDERATION OF RIGHT TO DIE SOCIETIES. Holanda: aumento de 20% nos casos de eutanásia em condições psiquiátricas. The World Federation of Right to Die Societies, 2024.
CURRENT REVIEWS, J.: GIELEN, S.; VAN DEN BRANDEN, B.; BROECKAERT. Attitudes of European Physicians toward Euthanasia and Physician-Assisted Suicide: A Review of the Recent Literature, 2024.
SANTOS, SHEILIANA, e VIRGÍLIO NOBERTO JESUS NETO. "EUTANÁSIA NO DIREITO BRASILEIRO." REVISTA A FORTIORI 2.2 (2021).
Junqueira, Beatriz Pereira, e Paulo Henrique de Souza Freitas. "Liberdade de autodeterminação: um panorama da eutanásia no direito brasileiro à luz de Immanuel Kant." Revista Direito UFMS 6.2 (2020): 172-194.
Rosa, Isaac Peixoto Costa. "A eutanásia no direito brasileiro." Acesso em 7 (2017).
Morato de Andrade, Otávio. " STATUS LEGAL DA EUTANÁSIA E ORTOTANÁSIA NO BRASIL." Revista da Seção Judiciária do Rio de Janeiro [Online], 23.47 (2019): 96-109. Web. 14 Jun. 2024
Autores[edit]
Douglas Chenet Ferro e Diogo Castellani Brandalise