Anistia
Anistia e a extinção da punibilidade[edit]
Introdução[edit]
Desde que o ser humano passou a viver em grupo, surgiram conflitos. Para resolvê-los, ele usou diferentes formas de solução, que evoluíram com o tempo e o desenvolvimento da sociedade. A punibilidade é vista como a consequência natural da prática de um crime, que se configura pela existência de uma conduta típica, ilícita e culpável (FREITAS; NETO, 2015, p. 160). Enquanto alguns autores defendem que a punibilidade faz parte da estrutura do crime, a maioria entende que ela apenas surge após sua ocorrência. Existem situações em que, mesmo havendo crime, a pena não é aplicada por razões de interesse público, chamadas de escusas absolutórias. Além disso, o Estado pode deixar de aplicar a pena nas chamadas causas de extinção da punibilidade, como a morte do agente ou a prescrição, previstas no artigo 107 do Código Penal. Tais causas podem ser reconhecidas em qualquer fase, inclusive no inquérito, por se tratarem de matéria de ordem pública (FREITAS; NETO, 2015, p. 161).
A anistia como forma de extinção da punibilidade[edit]
Nesse contexto, insere-se a anistia, instituto que, embora tenha efeitos jurídicos ao extinguir a punibilidade, gera controvérsias por sua natureza de promover o esquecimento. Ao apagar juridicamente os fatos, a anistia pode comprometer a memória social, elemento essencial à prevenção de novas violações. Assim, mesmo que o direito escolha não punir, a sociedade deve manter viva a lembrança dos acontecimentos para que os erros do passado não se repitam, preservando a história por meio do resgate da memória coletiva (KLEMT, 2010, p. 14).
A anistia é a forma mais ampla de perdão concedido pelo Estado, sendo caracterizada como um “esquecimento jurídico” do crime. Ao ser aplicada, a infração penal deixa de existir para o Direito, embora continue registrada pela História. Diferente de outros institutos, como o indulto e a graça, a anistia não se destina a pessoas específicas, mas a fatos determinados, possuindo, portanto, caráter impessoal. Ela pode prever condições subjetivas, desde que sejam gerais e não voltadas a indivíduos (VIEIRA, 2012, p. 1).
A graça, por exemplo, era um privilégio dos governantes, usado de forma ampla e muitas vezes arbitrária. Já na Roma Antiga, existiam práticas como o direito de apelar ao povo ou aos tribunos para evitar punições, e até mesmo o perdão coletivo concedido pelo Senado. Um exemplo marcante foi a *lex oblivio*, uma norma que determinava o esquecimento de certos crimes em momentos de troca de governo, buscando promover a paz entre grupos em conflito (AVELAR, p. 31).
Efeitos jurídicos da anistia[edit]
Do ponto de vista prático, a anistia pode ser concedida tanto antes quanto depois da condenação definitiva. Quando ocorre antes do fim do processo, ela impede a continuidade da ação penal, resultando no arquivamento do inquérito ou na absolvição do réu. Já quando é concedida após a condenação, a anistia apaga a pena e todos os efeitos penais da decisão, mesmo que a punição já tenha sido parcialmente ou totalmente cumprida.
No entanto, é importante destacar que os efeitos da anistia não se estendem à esfera civil, pois a vítima continua tendo o direito de buscar uma indenização pelos danos sofridos, e a parte da pena já cumprida não é devolvida ao anistiado (VIEIRA, p. 22).
A anistia no Brasil: Lei de 1979[edit]
No Brasil, a aplicação mais marcante desse instituto ocorreu com a Lei da Anistia de 1979, aprovada durante o regime militar como parte de um acordo entre o governo e setores da oposição. Essa lei teve como objetivo iniciar a transição para a democracia, mas acabou beneficiando não apenas os perseguidos políticos, como também os agentes do Estado envolvidos em tortura e assassinatos.
Isso porque os crimes cometidos por militares foram considerados "conexos" aos crimes políticos, o que impediu a responsabilização penal de seus autores. Assim, ninguém foi punido.
Em 1995, uma nova lei reconheceu oficialmente os desaparecidos políticos e concedeu indenizações às suas famílias, mas os responsáveis pelos crimes seguiram impunes. Como resultado, muitas figuras ligadas à repressão continuaram ocupando posições de poder mesmo após a redemocratização (LEMOS, p. 7-12).
5 Considerações finais[edit]
A anistia, embora configurada como mecanismo jurídico de extinção da punibilidade, provoca intensos debates ao promover o esquecimento de fatos que deveriam integrar a memória coletiva de um povo.
No Brasil, a utilização desse instituto, especialmente durante o período de redemocratização, evidenciou o dilema entre a pacificação social e a responsabilização penal.
A análise revela que, mesmo extinta a punibilidade, a memória histórica e o direito à verdade são indispensáveis para evitar a repetição de violações e garantir a efetiva consolidação de um Estado democrático de direito.
Referências[edit]
- AVELAR, M. P. R. A. A anistia no direito romano. *Revista do Tribunal Regional Federal da 1ª Região*, Brasília, p. 31. Disponível em: [1]. Acesso em: 10 abr. 2025.
- FREITAS, J. C. S.; NETO, F. V. B. *Direito penal: parte geral*. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2015.
- KLEMT, A. L. F. A função simbólica da anistia. *Synthesis: Revista de Filosofia*, Pará de Minas, v. 2, n. 1, p. 14, 2010. Disponível em: [2]. Acesso em: 10 abr. 2025.
- LEMOS, R. A Lei de Anistia brasileira e a justiça de transição. *Topoi*, Rio de Janeiro, v. 12, n. 22, p. 7-12, 2011. Disponível em: [3]. Acesso em: 10 abr. 2025.
- VIEIRA, V. R. *A anistia no direito penal brasileiro*. Instituto Processus, 2012. Disponível em: [4]. Acesso em: 10 abr. 2025.
- VIEIRA, A. R. Aspectos da anistia: efeitos penais e civis. *Revista Eletrônica da Escola de Gestão Judiciária Federal*, Brasília, v. 1, n. 1, p. 22. Disponível em: [5]. Acesso em: 10 abr. 2025.
Autoria[edit]
Este texto foi elaborado por **Emanuel Moreira Veber** e **Maria Antônia Mello Dalastra** como parte das atividades avaliativas da disciplina.